quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Uma puta mulher

Na primeira vez que a vi, achei que ela era um anjo. Mas não: era uma puta.

Não digo que era uma puta figuramente. Era puta puta mesmo. Fazia tudo por dinheiro. Dava, pegava no seu cacete, chamava de "amor" ou simplesmente fingia ser sua namorada. Aceitava até tapa na cara, se não ficasse marca e rolasse um adicional. Fazia de tudo. Atendia em domicílio. Era uma puta de uma puta. Só não aceitava tíquete restaurante, porque isso é inadmissível.

Voltando: na primeira vez que a vi, estava no balcão de um bar. O bar estava vazio, só nós dois, o cara mal encarado do balcão, o silêncio, um pingado e um pão na chapa. Ela se sentou sem pedir nada, sacou um espelhinho e retocou o batom. Tinha o rosto mais angelical que havia visto no mundo. A pele perfeita. Os olhos radiantes. Era 6 da manhã e eu tava de ressaca. Era 6 da manhã e a puta - porque posso chamá-la assim sem medo - estava cheirosa, exalando um perfume que nunca tinha sentido antes. Afinal, uma puta que tem gosto mais refinado que muita mimadinha que comi por aí.

Naquele momento, eu travei. Escutei uma mosca pousar sobre uma coxinha, o pano de prato secando o copo, a gordura que estalava sobre a chapa... E meu pau ficou duro. Duro como se eu estivesse acabado de acordar, e eu nem dormi, cacete. Duro como se eu tivesse tomado viagra, mas não que eu saiba como é a sensação. Duro como se nunca mais fosse ficar mole na vida, como se eu pudesse dar 10 sem tirar e mesmo assim continuar com meu falo apontando para o norte, pronto para o campo de batalha. E eu só queria ficar de boa, tava numa puta ressaca.

Ela descruzou e cruzou as pernas. Juro. Se eu fosse precoce, já tinha ido. E daí eu poderia dizer, com e sem ironias que rolou um final feliz na história. Mas não, só tinha eu, o cara do balcão, o pão na chapa, o silêncio e ela. Sabe o que mais tinha? Uma arma. Na minha cintura. E foi aí que nem pensei em mais nada. Mostrei o cano pra moça - que fique claro, a arma - e olhei para o mal encarado. Ele consentiu. Entrei com ela no banheiro, e não precisei mandar fazer nada. A puta tinha tesão num cara armado. Seria a melhor foda da vida se não fosse o fedor que vinha da louça castigada e rachada daquele muquifo. Confesso que beijei a boca da puta. Foda-se.

A vadia me deu seu telefone. Trepamos algumas vezes. Era estudante de moda de uma tradicional (e cara) faculdade paulistana. Fazia dieta, yoga e um boquete maravilhoso. Pagava a mensalidade absurda com sangue, suor e gozo, ainda mantinha um carro do ano e um apartamento em Higienópolis. Dava bom dia por porteiro. Doava dinheiro pra filantropia. Curtia os Stones e fazia cupcakes. Pra um fodido como eu, até que era um bom partido.

Ficamos íntimos, andávamos de mãos dadas no Ibirapuera. Talvez ela fosse mesmo um anjo. Mas não: era uma puta. Um dia ela apareceu com um chupão no pescoço, e então botei meu cano na boca dela. Que fique claro: o cano mesmo, não o pau.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

The Underdog

Nayara não queria levantar-se da cama. Céu ainda escuro como havia deixado no outro dia, esfregando os olhinhos numa longa despedida aos seus cobertores. Enrolou tanto que teve que se arrumar rapidinho, e quase esqueceu coisas importantes da sua bolsa na correria. Mas o dia correu tranquilo, como sempre. Ela ficava numa parte reservada do seu ser. Meio rejeitada por sim mesma, tímida, oculta, quase não existente. Mas estava lá, existia, arrastada para lá e para cá, vivendo o cotidiano apagada, sem brilho. Mas Nayara tinha fome de sair, de conhecer as coisas, e sabia que o Sol brilhava todas as manhãs também para ela. Queria libertação.

Não, ela não era inexpressiva, fraca ou nula. Ela apenas era reprimida, oculta. Mas se tinha essa sina de ser quase invisível, também poderia utilizar-se disso como um poder, uma nova forma de reafirmar sua vontade e, silenciosamente, ser persuasiva. Nayara era reprimido pelo racional, Nayara estava esquecida fazia tempo, mas não morta. Pelo contrário: nas sombras ela se fortalecia vendo o Sol, cativa em uma prisão gélida e nutrindo-se apenas de esperança, que, um dia, seria forte de novo e conseguiria enfim romper as amarras que a impediam de ser feliz.

A vida não era um presente para ser desprezado, seus dias não seriam vividos todos dessa forma e para sempre. Ela era forte, apesar de ser desprezada, de ser improvável, de ficar oculta e entrevada. Era um momento, uma fase, era um momento tal qual o que vivia todas as manhãs na condução até o trabalho. Um cochilo meio incômodo com vidros embaçados, mas por trás de tudo aquilo existia bela paisagem a ser explorada. Era só questão de despertar. Desperte, Nayara!

E assim fez.

Um dia, quase por acidente, conheceu outro underdog. Outro reprimido, outro aprisionado que queria explorar o mundo e gritar. Sair do cativeiro, se libertar. Eles se corresponderam. Eles vislumbravam juntos algo diferente. E, quando perceberam, sua imaginação conseguia livrá-los dos cativeiros. Pensaram tão forte na libertação que se pegaram, um dia, segurando mãos, de verdade. E continuaram imaginando, até que um dia perceberam que não havia mais cativeiro: apenas os olhos do outro.

Nayara era o sonho. Nayara era o amor reprimido. Era a chama apagada há tempos, era o impossível e imprevisível. Nayara tinha sido dada como morta, mas apenas estava oculta. Mas, invisível, ela soube esperar a hora certa de emergir e se reafirmar. Nayara é o que pulsa no coração de toda mulher que diz que não precisa de amor pra viver. Todos precisamos.

Nayara é a coragem, que, mesmo sendo subestimada, persiste em ter seus lampejos. É aquela que cedo ou tarde aparece, é aquela que não desiste por ser desprezada e maltratada. É aquela que existirá para sempre, que se apropriará dos seus sonhos mais ocultos e fará você sorrir e viver em um mundo que achava que nunca mais veria. Nayara é a negação que vira afirmação, simples e complexa, em sua pequena forma e rejeitada existência.


terça-feira, 25 de junho de 2013

Viva la ruivolución!

Da inércia eu saí, do comodismo e sofá.
Saí de um tempo parado e tedioso,
em que nada captava a atenção de minhas retinas
para conseguir fazê-las enfim brilhar.

No reflexo de uma vitrine, janela qualquer,
emergiram seus cabelos incandescentes,
tal qual faz o sol todas as manhãs no horizonte.

Então você proferiu as palavras de Bukowski,
um molotov explodindo dentro da minha cabeça.
E, perante a descoberta de sua beleza poética,
nasceu um inédito ímpeto em minha vida.

Eu quero mais é que o mundo renasça em caos
pelo incendiário desejo desperto por seus cabelos.
e que as ruas sejam tomadas pela inquietude.
São as cinzas que farão um amanhã mais belo.

domingo, 2 de junho de 2013

Encontros Bizarros

A primeira vez que eles se cruzaram, nenhum dos dois lembra. Se forçar, ele vai lembrar que ficou intrigado por que raios no fim da primavera uma mulher usava um sobretudo. Sobretudo e botas, joelhos nus, figura estranha andando naquela movimentada avenida. Desconsiderando a vestimenta, seu visual era neutro. Qualquer um que olhasse pra ela falaria que seu nome é comum, sua cara é de conhecida e não conseguiria descrever nem os cabelos. Certamente, para os mais desatentos, ela passou despercebidas. Mas o olhar dele pousou sobre ela no exato momento entre um devaneio e outro. Acabou um pensamento, olhou para ela e partiu para o próximo. Assim seguiu a vida.

O segundo encontro dos dois foi ainda mais estranho. Era uma noite aparentemente comum, ele apenas planejava ficar quieto, talvez encontrar uns amigos e dormir cedo. Ultimamente, andava sem pique pra qualquer vagabundagem. E não que fosse um boêmio nato, ou sedutor barato, ou um homem da noite. Mas em algum intervalo entre os vinte e os trinta anos, a maioria dos homens tem um período de vida noturna, quer seja por instinto de caça ou mesmo arrastado pelos amigos. Acontece.

Mas, nessa noite específica, ele apenas queria descansar. Andava trabalhando muito. Andava ganhando pouco. Queria ficar tranquilo, economizar uns trocados. Nada de esbanjar, nada de ressaca no outro dia. Era apenas quinta-feira, e sexta era um dia longo para se trabalhar sonolento. Mas, por mais que tentasse, ele nunca poderia ignorar a lei universal que rege as quintas-feiras. Uns dizem que esse dia específico da semana tem uma áurea mística e leva as pessoas aos seus atos mais loucos. Outros apenas simplificam: "quinta é a nova sexta". De qualquer forma, é quando ocorre o inusitado. E uma pequena cervejinha com os amigos pode virar uma grande epopeia.

Lá estava ele num bar novo, pois a áurea do dia o afastou do boteco corriqueiro. O preço elevado da cerveja o fez partir para bebidas mais fortes, enquanto sua falta de grana o impediu de investir vinte reais em um sanduíche qualquer ou em uma porção de pasteis (8 unidades). Estômago vazio, a gastrite, mal de sua geração, reclamando. A vodka barata passeando pelo seu sistema digestório como uma marcha de grevistas na Avenida Paulista: lentos e barulhentos, prontos para ser dispersados de forma violenta. Enfim, lá estava ele, no mesmo papo furado de sempre com um velho amigo. Aí apareceu um conhecido, que resolveu pagar um drink a mais e... Puff, lá estava ele.

Era sua primeira vez em um prostíbulo. Não porque defendesse qualquer ideal contra transformar a mulher ou o sexo em objeto, mas simplesmente porque seu pudor excessivo o fazia ter calafrios (e não daquele jeito) só de pensar em diversas mulheres que considerava vulgares se esfregando nele. O ambiente pesado, os homens querendo mostrar poder liberando instintos primitivos. E... Aquele par de seios! Por um momento, ele ficou hipnotizado e, de repente... Estava lá. Com a cara enfiada entre aquele par de seios, em uma cama barata que rangia, os gemidos do quarto ao lado se equiparando ao abatimento de um suíno. E era ela, que não parecia tão sem-graça como no primeiro encontro, de cara maquiada, seios fartos (e siliconada), subindo nele como se fosse o último homem da terra. Pelo efeito do álcool ele nem desfrutou direito do momento, vomitou na calçada assim que saiu do lupanar e ficou com um rombo na conta bancária. Paciência.

E teve o terceiro e último encontro. Talvez porque 3 seja um número cabalístico, ou apenas por capricho do destino. Eles estavam no mesmo bistrô da Bela Cintra, em um sábado qualquer num horário meio tarde para se jantar. Ela porque mesmo no seu dia de folga o hábito já a impedia de dormir cedo. Então ia com um decote caprichado em lugares frequentados pela classe média pra ver se arrumava um freela com algum coroa carente e solitário. Ele porque tinha preguiça de pegar fila, e como tinha conseguido arrastar a estagiária do escritório para jantar, fechando o transporte público ele poderia convencê-la a ir para seu apartamento e talvez conseguir algo a mais.

Foi quando cinco pivetes entraram anunciando o arrastão. Mandaram todos para baixo da mesa, com as mãos sobre a nuca, relógios, celulares e carteiras à frente. Ele atendeu prontamente, já que nem nos seus devaneios mais ousados pensaria em reagir a um assalto. Mas quando abaixou, deparou-se novamente com aqueles pares de peito, querendo saltar pelo decote da moça. Recordou então da noite mais louca da sua vida, de como perdeu a cabeça, de como desejava novamente estar com a cara entre eles. Pensou tanto, teve tanto tesão, que não conseguiu seguir os comandos dos bandidos. Eram cinco menores de idade armados, num misto de medo e sensação de poder. Gritaram e ele não ouviu. Sua mente apenas focava nos peitos. Foi quanto o mais estourado deles puxou o gatilho e espalhou seus miolos pelo chão do bistrô. Executado de forma horrível e brutal, ele ainda morreu de pau duro.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Distração

Apaixonado, ele se distraía.
Esquecendo-se, tropeçando.
- Ah, mas e o beijo dela?
Desse, ele nunca se esquecia.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Leveza

Meu coração parece que
se encheu de hélio e voou.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Primeiro poema do dia

Se me furtam algumas horas de sono,
ao menos presencio belo espetáculo:
a linda aurora do seu despertar.

Na leveza de um riso nasce o dia,
e os olhos me fitam com alegria
e flagrado eu tento disfarçar.

Assumo que seu sono eu velava,
e por mais estranho que pareça,
como conseguiria negar?

Você ri das minhas besteiras,
e me surpreende com um beijo:
é acordado que me ponho a sonhar.