terça-feira, 13 de julho de 2010

Rock n' Roll

Os instrumentos estavam abandonados. Há tempos ninguém mais entrava naquela sala de ensaios, que já estava escura e empoeirada, entrando apenas um fecho de luz fraco, que ainda enfrentava a penumbra. As baquetas em cima da caixa surrada, os pratos ainda arrumados do jeito que ele gostava. Depois de dar as últimas pancadas, enfurecido e tirando um som que ninguém mais conseguiria tirar, foi se deitar no quarto. Depois disso, apenas acharam seu corpo estirado, com uma garrafa de vodka do lado. Muita gente chorou no enterro.

Estava acabado. A morte de um bastava para que aquela formação se desfizesse, até por respeito. Não daria mais para a música ser perfeita sem ele. Tempos quebrados, espetáculo, solos invejáveis e um barulho que só ele arrancava do intrumento. E como aquilo inspirava os outros, gênios, gigantes que caminhavam e não tinham limites. Mestres no que faziam, capazes de hipnotizar multidões com performances arrebatadoras. E o povo sempre pedia mais, não queria que eles saíssem do palco.

As pancadas fortes, o ecoar de pratos, a guitarra arranhada, o baixo que caminhava perfeito sobre a música e os gritos agudos formavam a palavra universal, escrita com o número de letras compatível com o número perfeito de integrantes... Apenas 4 letras, formando verbo e substantivo: rock.

É verdade, a sala estava abandonada, e eles reuniram-se poucas vezes para tentar fazer magia novamente, mesmo sem ele. E passaram-se anos, décadas desde o auge. O mundo já era diferente daquele que eles dominaram, as pessoas e as questões filosóficas. Mas alguma coisa ainda sobrevivia, o espírito da música que era passado de geração em geração. E onde há um menino com uma guitarra, ainda há música para ser tocada. Mesmo que ele esteja aprendendo os primeiros acordes, mesmo que daqui há uns anos ele não suba no palco e viva uma vida normal. Um sonho esteve em seu coração por aquele tempo, e toda esta paixão basta.

Muita coisa foi deixada para trás. Mas ainda existem milhões que vivem o sonho. E, em contraste com a sala de ensaios abandonada e escura, há uma salinha de música simpática e iluminada. Lá, como nos velhos tempos, uma agulha risca um vinil. E há um casal apaixonado deitado no tapete, dando beijos embalados pelo som e deixando com que o ritmo intensificasse seu amor.