quarta-feira, 26 de setembro de 2012

You didn't mean me no good

Chego em casa puto. A escuridão reflete meu estado de espírito. Abro a geladeira, mas seu conteúdo não dialoga com a minha fome. Saio da cozinha insatisfeito e vou para a sala: hoje meu jantar será servido em um copo.

O aroma que sai da garrafa desperta meus sentidos. Tomo um gole suave que esquenta instantaneamente. Lá fora, mesmo sendo mais uma noite ordinária, tudo parece frio. Meu rosto começa a esquentar enquanto me afundo no sofá, perdido em pensamentos enquanto giro o copo involuntariamente.

Sinto novamente seu peso no meu colo. O copo some, estou jogado depois de um dia duro e você está lá, cheirosa e sorrindo. Meu mal-humor desaparece, seus seios tocando suavemente meu rosto conseguem soltar meus tensos músculos das costas e ombros. Você sabe que assim consegue tudo o que quer, e apenas um membro do meu corpo fica rígido. A resposta é um riso malicioso, uma língua no ouvido, em uma hesitação proposital para me beijar.

É o tempo de eu colocar a mão na sua nuca e puxar seu cabelo com firmeza, mas sem brutalidade. Aí você sente que estou decidido e cede, me beija. Seu corpo é quente, mais quente que o 12 anos, mais perfumado que o aroma que sai da garrafa. E eu quero ele com muito mais vontade, mas vou saboreando devagar o momento. Ainda não me dou ao trabalho de despi-la.

Com leves mordidas em sua boca e beijos suaves no pescoço você geme. Já perdeu o controle, já esfrega seu corpo no meu como se fosse o único jeito de fazer o calor passar. Minhas mãos por debaixo do seu vestido sentem a maciez da sua pele, puxando mais seu corpo contra o meu, como se pudesse haver mais contato do que já existe. Marota, você se levanta com um ar inocente e ao mesmo tempo malicioso, erguendo uma sobrancelha enquanto morde a pontinha de um dedo, rindo.

O vestido toca o chão.

Admiro seu corpo mesmo com pouca luz. Já o conheço de cor, cada pedaço maravilhoso dele, cada curva e cada segredo que ele tem pra contar. Nesta hora, é tudo que eu quero e desejo. Então você puxa minha mão e passa sobre a sua barriga, nem muito para cima nem muito para baixo, para que eu decida onde que elas irão passear a seguir. Eu decido ir para baixo, mas antes que possa sentir o calor que há entre suas pernas, volto a mim.

Estou sozinho na sala. A única parte real do meu devaneio é o músculo tenso no meu corpo. Mas que merda. Nesse frio você esquentaria bem a minha cama. Ou meu sofá. Ou meu tapete. Termino de virar minha janta do copo e praguejo. Eu só tive um dia duro.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Poison

Pra ser sincero, eu quase não me lembro de nada. Só sei que os ponteiros do relógio não correspondiam ao tempo. E meu corpo meio que se arrastava, devido às poucas horas de sono. Dormia tão pouco e achava que estava me mantendo acordado, mas estar de pé sem alguma lucidez talvez não seja a melhor definição para isso. E eu sonhava. Num delírio que misturava sentimentos bons e maus, que me consumiam mas também me moviam para frente. A dor chegava de um jeito estranho. Estava anestesiado, mas sabia que doía muito. Mas não me cortava. Não sangrava. Calado eu consumia a dor, em vez de ela me consumir.

Várias vezes cheguei a pensar em escrever aquela carta. A carta de louco no manicômio. A carta de quem sabe que a insanidade está se esvaindo lentamente, a cada grão que cai da ampulheta. Um veneno intenso se espalhava pelo meu corpo e mente, a visão ficava turva, mas no segundo seguinte eu voltava ao normal. A angústia de repente era pó, era cinzas que renasceriam, numa ave de fogo gélido que me queimaria por dentro. E o ciclo se repetia por tantas e tantas vezes que eu não conseguia largar a caneta nem riscar o papel. A ponta da caneta fixa espalhava o preto sobre a folha. O veneno. Maldito veneno.

E eu não me lembro de mais nada. Lembro dessa cena se repetindo infinitamente na minha cabeça. Lembro como se fosse pesadelo, algumas partes recobertas em névoas, outras abraçadas pelas trevas. Eu não me recordo de como cheguei aqui.

Eu sei que me levaram entre doses de bebida quente e fumaça de cigarro. Fui carregado nos ziguezagues da rua, derrubado em sarjetas, e escutava vozes e risos. Mas eu não ria, porra. Eu não achava essa merda engraçada. Eu não sabia qual era a piada. Eu só queria parar de suar frio, dar meus próprios passos. Queria que a febre passasse, a temperatura caísse mas não a ponto de eu virar um gélido cadáver entre velas e incensos. Nunca  soube rezar, mas tive tantos e tantos diálogos imaginários com algum deus e não lembro de nenhum. Minha vista, meus pensamentos, nada mais pertencia a mim. E os malditos ponteiros do relógio mentiam. A todo o tempo. Os tics e tacs me irritavam. Me deixavam louco.

Mas tudo virou silêncio.

Cheguei aqui. Sozinho e maltrapilho. A sensação ruim passou. Podia respirar leve, podia ver o verde das árvores e sentir o calor do sol. Arrisquei sorrir. Arrisquei cantar. Arrisquei dar um passo e depois outro, e comecei a caminhar. A febre passou junto com os delírios. No espelho, meu rosto era o meu novamente.

Mais uma vez no ponto de partida, tudo voltou a fazer sentido. Não sei quanto tempo passou, ou o que fiz nesse tempo. Só sei que algum ou vários milagres me curaram. Só sei que em alguma hora eu precisei me agarrar a algo e segurei forte. Talvez não tenha sido isso a salvação, mas foi o fio da meada da esperança. Agora eu não sei o que fazer. Não tenho planos e também não me importo. Quero apenas colocar meu chapéu na cabeça e dançar na chuva.